É preciso que se diga que vivemos em um tipo de sociedade com um nível de alienação nunca antes alcançado. A vida coisificou-se, virou mercadoria descartável, igual ao objeto em uma embalagem de plástico que, após ser usado, se amassa e se joga no lixo. Os sentimentos de perda, separação e saudade passaram a ser coisas de nostálgico, de gente velha e ultrapassada.
Esse caso do assassinato da menina Isabela Nardoni, asfixiada e jogada pela janela do sexto andar - um horrível crime envolto em mistério -, em que o Promotor Público acusa a madrasta e o próprio pai da criança, é exemplar. Até o presente, ninguém os viu chorar, pelo menos em nenhuma imagem da televisão. É lamentável dizer, mas a mãe de Isabela também não chorou, com a desculpa de que a filha não gostava de vê-la triste.
Não será necessário ir a São Paulo, pois aqui no Ceará, há pouco tempo, um dos canais de televisão local mostrou o descaso com a vida de uma criança que caiu dentro de um buraco cheio d’água, lama e entulho, em um bairro da periferia de Fortaleza. O pai da criança, ao ser entrevistado, diante da câmera, simplesmente disse: “O menino estava tomando banho, afogou-se e morreu”. Falou assim, sem choro, nem vela.
Outra cena, essa por demais conhecida, exibida em todos os programas policiais e sensacionalistas das televisões brasileiras é de puro humor negro: o indivíduo assassinado está caído ao chão, coincidentemente próximo a um terreno baldio de um bairro pobre, e, ao fundo, há um bando de jovens gesticulando para a câmera, fazendo símbolos referentes ao rock, ao nazismo, às torcidas organizadas de times de futebol etc; ao morto, sequer um olhar.
À propósito, quando Karl Marx escreveu que o capitalismo tinha o poder de transformar todas as coisas – materiais e imateriais – em mercadorias, seus críticos disseram tratar-se de simples alegações de um filósofo esquerdista. O caso do assassinato da menina Isabela e de outras vem comprovar que hoje a indiferença à vida é parte intrínseca do capitalismo, alienante e cruel.
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