domingo, 12 de dezembro de 2010

NOVOS CURRAIS

Como num festival de sacos de maldade, as empresas terceirizadas que prestam serviço às prefeituras do Ceará estão presenteando seus empregados com demissão. Esses trabalhadores foram contratados bem antes do último período eleitoral e, hoje, passadas as eleições, são jogados no olho da rua. Pelo visto, Papai Noel não teve a menor compaixão por esses indivíduos que entrarão na estatística dos desempregados.

Eles são demitidos com a promessa de que em breve retornarão a seus postos de trabalho. Mas quem garante? Em alguns casos, o vereador ligado ao prefeito, o secretário de obras, o chefete político ou alguém da própria empresa, isso para não queimar o filme do desgastado prefeito. Ou seja, na hora da demissão, o prefeito não aparece. Ele surge somente no momento da admissão com ares de herói.

Então vem a pergunta: o que diferencia o atual prefeito do antigo? Em termos de curral eleitoral, pelo menos, a cerca se modernizou, mas a dependência é a mesma. Convém frisar que esse assunto de demissão, ainda que via empresa terceirizada, não veio à baila durante os debates eleitorais de outubro. Será que os eleitores que votaram nos candidatos - deputados, senadores e presidente - desses prefeitos, caso soubesse que seriam demitidos, votariam nos mesmos candidatos?

O que se passa na cabeça dessas pessoas que perderam o emprego às vésperas do Natal? É difícil dizer. Provavelmente são resignados e irão rezar na esperança de retornar a seus antigos postos de trabalho. Nas condições do regime capitalista, a maioria dos trabalhadores não consegue vencer o medo de perder o emprego e esse fato é fundamental para mantê-los subjugados e sujeitos a todo tipo de assédio moral.

Por outro lado, o prefeito, quando chega ao poder - e tanto faz que seja de direita, centro ou esquerda -, esquece as promessas de palanque e as dores da população. Quase todos se enquadram na antiga e reacionária fórmula administrativa de pão e circo: uma obra mais ou menos, uma festa com bandas de forró, cujo cachê é uma fortuna para os cofres do município, e, quando muito, uma costura de acordozinhos domésticos entre vereadores que fazem parte do grupo em seu apoio na câmara.

O tal jogo de "contrata, demite e contrata", as obras insignificantes que jamais mudarão o perfil da cidade e os shows caros com artistas midiáticos apenas alimentam a alienação de um povo. Esse tipo de político conta com o adormecimento da sociedade e, como provam as experiências, ele e seu grupo tendem a reinar no município entre vinte a trinta anos.

O estranho é que, em plena democracia, os partidos de esquerda e os sindicatos dos trabalhadores virem as costas para esse e outros problemas sociais, não convocando a população às ruas, o que seria o seu papel. Na realidade, faltam ao município - e, por que não dizer, ao país? - uma cultura de participação política, cultural e social à base de reflexão e crítica. Não é só votar e esperar quatro anos para fazê-lo de novo. O espírito de participação crítica tem que lutar em favor de uma administração popular e contra os novos currais eleitorais para fazer a democracia.

DEMOCRACIA DIRETA - O CAMINHO

A situação das praias do litoral cearense - e quiçá de boa parte do país - é crítica. Polui-se indiscriminadamente a costa marítima: desde a indústria, que joga dejetos no mar, ao cachorro da madame, que deixa cocô na areia. Acrescentam-se ainda garrafas de plástico, vidros quebrados, restos de comida e toda uma variedade de lixo que desenha um cenário sujo na paisagem.

O problema se complica quando as praias são ocupadas de forma irregular por barraqueiros. Não me reporto aos donos desses quiosques, que também são responsáveis pela sujeira espalhada nas areias. Refiro-me aos ditos proprietários das médias e grandes barracas, essas que pretendem desempenhar a função dos outrora clubes sociais e que ofertam à clientela piscinas, além de restaurante e bares para shows.

O proprietário da mega barraca argumenta em seu favor que oferece muitos empregos e que tem o máximo cuidado com a higiene do ambiente. Não admite que vendedores ambulantes circulem por sua barraca, principalmente aqueles que vendem camarão ou peixe frito com cachaça. Nesse caso, democracia na praia parece ser também só de fachada.

A excessiva ocupação e a consequente poluição das praias se torna um problema sério, a curto e a longo prazo. Leis são desrespeitadas e decisões judiciais, cassadas. Tudo em nome do Eldorado de um "desenvolvimento" a qualquer custo, que às vezes se chama turismo. Para tanto, vamos gastar uma fortuna com o Aquário, também conhecida obra ao turista, não importando que grande parte da população cearense costume sofrer pela estiagem e a fome.

A campanha eleitoral acabou, mas as questões sociais, não. Portanto, esse debate está apenas começando e, se preciso, vamos às ruas. É hora de uma nova campanha, desta feita, sobre as barracas na praia, com a participação de toda a sociedade. O povo precisa construir o caminho da democracia direta para a solução dos graves problemas sociais.

LIÇÃO FRANCISCANA

Ter lido algumas biografias a respeito da curta vida daquele que se fez o Pobre de Assis não me dá o direito de opinar sobre a fé religiosa de quem quer que seja. Quando muito, posso dizer que aprendi com essas leituras, acrescidas de conversas com minha saudosa mãe, que um dos valores fundamentais na edificação de quem busca Deus está na humildade, princípio esse seguido à risca e propalado por São Francisco.
Nesse caso, quem se dirige ao Santuário Franciscano para fazer orações, agradecer ou pedir graças, normalmente o faz revestido de fé e humildade, aí compreendido o anonimato. Ainda há quem faça essa visita a pé. É bem verdade que hoje esses peregrinos são poucos. São homens e mulheres simples, gente do povo, que, ao avistarem a estátua do taumaturgo, têm as expressões do rosto revigoradas de solidariedade, marca registrada do Irmão Menor.
Isso não quer dizer que uma pessoa abastada, devido a um problema de saúde, velhice ou falta de tempo, não possa ir ao Santuário de automóvel. Pode e deve. Afinal, um momento de reflexão com os valores cristãos proclamados por São Francisco - eleito pela Organização das Nações Unidas (ONU) o homem do milênio - pode ser capaz de transformar a vida de qualquer cidadão, tal foi a força da radicalidade com que ele viveu sua opção em favor dos que sofrem, mormente os pobres.
Doutra, é inconcebível a postura antiética com que alguns políticos insistem em visitar o Santuário de São Francisco, ou de qualquer outro santo, em épocas eleitorais e acompanhados da grande mídia. Pretendem passar uma imagem de piedosos devotos, quando não passam de prepotentes e demagogos. Mal percebem que essa artimanha da politicagem não consegue mais fazer o povo de bobo.
Não é preciso, pois, ser um exegeta em questões franciscanas para constatar que riqueza não combina com humildade do Santo de Assis. E, como está difícil acreditar na honestidade dos políticos, também é quase impossível acreditar que um indivíduo arrogante possa ser um franciscano.